Trump Eleito: O que esperar?
Com a recente vitória de Donald Trump nas urnas americanas, várias dúvidas surgem sobre como será o seu retorno à Casa Branca e quais impactos para os EUA e o Mundo. Separamos 7 pontos de atenção:
Ótica Protecionista
A perspectiva protecionista retorna com força sob a liderança de Trump, e a prioridade é clara: estimular o crescimento interno, protegendo o mercado americano da concorrência internacional, especialmente, da China. Essa postura, de viés protecionista, enfatiza o aumento de tarifas sobre importações, especialmente em produtos que competem diretamente com a produção local.
A disputa com a China, principal rival comercial e tecnológico dos Estados Unidos, tende a se intensificar, levando a novas sanções e barreiras comerciais para produtos chineses e, possivelmente, ampliando as restrições no campo das tecnologias sensíveis, como chips voltados para uso na inteligência artificial. Esse ambiente reforça o cenário de tendencia a desglobalização, com o enfraquecimento das relações multinacionais e o foco no comercio com países amigos (friendshore) ou na produção interna.
Resta saber a extensão dessas medidas e se o povo americano aceitará o custo inflacionário do protecionismo econômico.
Pressões Inflacionárias
O impacto de um aumento nas tarifas de importação traz, inevitavelmente, um custo adicional aos produtos estrangeiros consumidos nos EUA. Essa alta nos preços encarece os produtos importados, o que, por sua vez, pressiona a inflação interna. Isso gera um efeito contraditório: por um lado, o dólar mais forte devido a uma balança comercial mais positiva; por outro, uma pressão sobre o custo de vida, já que os consumidores terão de arcar com preços mais elevados, em especial nos setores em que os EUA dependem fortemente de importações.
Esse cenário, se intensificado, exigiria contramedidas para evitar que o consumidor americano fosse prejudicado em seu poder de compra, o que poderia alimentar tensões sociais e econômicas internas.
No Meio do Caminho, o FED
Nesse possível cenário inflacionário, o papel do Federal Reserve (Fed) torna-se ainda mais crucial. Com um mandato de manter a inflação dentro da meta de 2% ao ano, o Fed pode adotar uma postura mais rígida caso perceba que as políticas de Trump estão elevando a inflação acima desse patamar. Atualmente, a eleição de Trump já elevou a expectativa de que o Fed encerre mais cedo a atual trajetória de cortes de juros.
A probabilidade de que o Fed interrompa a trajetória de corte de juros, já na próxima reunião, subiu para 44,5% (em comparação aos 15% registrados no mês anterior). Esse movimento representa um desafio ao crescimento econômico americano e uma pressão para a continuidade de um dólar mais forte.
Desafios Fiscais
Outro ponto central da política econômica de Trump é a redução de impostos sobre negócios locais. Essa promessa busca incentivar o crescimento das empresas americanas em detrimento das estrangeiras que terão aumento de tarifas. Porém, se não acompanhada por uma redução proporcional nos gastos públicos, esse movimento pode agravar a situação fiscal do país.
Atualmente, com a dívida pública em 120% do PIB e a taxa de juros entre 4,5-4,75%, a situação fiscal pode se tornar uma bomba-relógio. Em um contexto de juros elevados, o custo com os juros da dívida pressiona o orçamento federal, potencialmente exigindo cortes em programas sociais ou elevações tributárias futuras. Em um cenário de gastos públicos estáveis ou maiores e uma queda de arrecadação com o corte de impostos, o déficit fiscal se ampliará, gerando um ambiente de instabilidade financeira e questionamentos sobre a sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas dos EUA.
Dólar Mais Forte?
O dólar segue como uma variável complexa de prever, influenciada por diversos fatores, como o possível aumento de tarifas sobre importações, que tende a favorecer um saldo positivo na balança comercial dos EUA. Com um volume menor de importações e com exportações possivelmente em alta, a demanda por dólares pode aumentar, valorizando a moeda no cenário global. Em contrapartida, o encarecimento dos produtos importados pode gerar pressões inflacionárias, exercendo um efeito de desvalorização.
Neste contexto, a decisão do Fed, sobre manter ou não os juros elevados, será essencial. Contudo, essa valorização também depende de outros fatores, como a reação de outras nações à mudança na política comercial dos EUA e a capacidade do setor exportador americano de sustentar ou aumentar sua produtividade. Mais do que tentar prever essas flutuações, é fundamental manter uma parte da carteira dolarizada.
Geopolítica: os caminhos para a Paz
Podemos afirmar que existem três caminhos para a paz: (1) submissão ao agressor,
o que raramente é uma opção aceitável para os EUA; (2) negociações com concessões mútuas, buscando um equilíbrio de interesses; ou (3) uma paz imposta pela força militar, com o objetivo de consolidar a posição dos EUA a longo prazo.
Nesse contexto, existem duas correntes que fundamentam a gestão geopolítica do futuro governo Trump: a isolacionista e a dos republicanos tradicionais. A primeira corrente, composta pelos conselheiros isolacionistas, defende uma política de não- intervenção, sugerindo que os EUA deixem países como Ucrânia, Israel e Taiwan lidar
sozinhos com seus desafios regionais. Essa postura pode proporcionar um alívio de curto prazo nos conflitos internacionais, ao abrir espaço para que países como Rússia, Irã e China ampliem suas esferas de influência. Entretanto, essa escolha de “não interferência” pode alimentar conflitos maiores no futuro, ao encorajar as ambições de longo prazo desses países.
Por outro lado, o grupo dos republicanos tradicionais acredita em uma postura mais assertiva para garantir a liderança dos EUA, ainda que isso implique intensificar conflitos e exercer pressão direta sobre regimes rivais. Essa vertente considera a paz como algo a ser conquistado por meio de negociações ou, se necessário, pela força.
A posição que Trump adotará entre esses dois extremos — entre a paz de submissão ou a paz pela força — ainda é incerta e depende de pressões internas e internacionais, mas sua escolha afetará profundamente a estabilidade geopolítica global.
Posicionamento Pró-cripto
Desde a eleição de Donald Trump, o mercado de criptomoedas entrou em forte alta, com o bitcoin disparando mais de 30% e quebrando recordes ao atingir US$ 92 mil. Essa valorização é impulsionada pela expectativa de uma postura pró-cripto de Trump, que prometeu demitir Gary Gensler, atual presidente da SEC (o equivalente à CVM americana), conhecido por sua resistência a regulações favoráveis ao mercado de criptoativos.
Além disso, há uma expectativa de que, sob o comando de Trump, os EUA criem uma reserva estratégica em Bitcoin, semelhante ao que é feito com a reserva de ouro. No entanto, consideramos esse evento improvável, dadas as restrições regulatórias. Também é válido citar que a criação de uma reserva estatal contraria a filosofia original de autonomia das criptomoedas, mas poderia sim trazer um aumento no preço do ativo.
Em resumo, o ano tem sido positivo para o bitcoin, que acumula valorização de 193% em reais nos últimos 12 meses. Mantemos uma posição estratégica no criptoativo, visualizando-o como um ativo descorrelacionado e de alto potencial, mas que deve ter um peso controlado na carteira devido à sua volatilidade.
Saiba mais:
- 'Trump não é liberal': as polêmicas propostas do novo presidente dos EUA para a economia - BBC News Brasil
- CME FedWatch - CME Group
- Análise: promessas Trump sobre bitcoin vão contra ideologia por trás das criptos | CNN Brasil
Brasil: À espera do pacote de corte de gastos
No Brasil, a espera por um pacote fiscal robusto prolonga a volatilidade nos preços e mantém as incertezas no cenário doméstico. A economia aquecida, com taxa de desemprego em mínima histórica de 6,4%, junto com o aumento do salário real e da concessão de crédito, mantém a atividade econômica acelerada e as pressões inflacionários. A Selic, atualmente em 11,25%, não tem surtido o efeito esperado em controlar a inflação na meta de 3% a.a.. Na última medição do IPCA, a inflação acumula alta de 4,76% nos últimos 12 meses, acima, inclusive, do teto da meta que é de 4,5%a.a.. Esse cenário reforça a ideia abordada no Panorama de Setembro de que a economia está acima do seu potencial, ou seja, que a oferta de bens e serviços não está conseguindo acompanhar o crescimento da demanda.
Nesse contexto, temos a trajetória da dívida pública crescente, com o FMI estimando que a relação dívida Bruta/PIB saia dos atuais 87% para 97% em 2029. Aumentando ainda mais o custo com juros da dívida, que foi de 614 bilhões em 2023, o que problematiza ainda mais a bola de neve do fiscal.
Por esses motivos, o pacote de corte de gastos negociado pelo Ministério da Fazenda tem estado nos holofotes nas últimas semanas. Um pacote robusto, capaz de reverter o déficit primário e conter o crescimento da dívida pública, poderia trazer alívio aos juros, a inflação e até ao mercado acionário.
Entretanto, o cenário provável é o de um pacote paliativo que, assim como o arcabouço fiscal de 2023, diminua a pressão sobre as contas públicas, mas sem resolver o problema de forma definitiva. Isso implicaria apenas em uma solução temporária, que deixaria o país vulnerável a novas pressões econômicas no futuro.
Saiba mais:
- Research
- Corte de gastos: governo segue discutindo pacote nesta semana, em meio a pressão interna | Economia | G1
- Fiscal deve determinar tamanho da alta de juros do BC em dezembro, avalia Galapagos | Finanças | Valor Econômico
- FMI piora projeção de dívida do Brasil e vê superávit primário apenas em 2027
- Governo: contas têm rombo de R$ 105,2 bi no acumulado em 2024
IPCA+ segue atrativo?
Diante desse cenário, o investimento em IPCA+ mantém sua atratividade, já que, para compensar a desconfiança fiscal, o Tesouro Nacional está emitindo títulos com rentabilidade real que chegaram a 7,0% ao ano. A relação entre o prêmio de risco e a situação fiscal do país é clara: quanto mais incerto o cenário fiscal, maior o retorno exigido pelos investidores para aplicarem em ativos brasileiros. Essa dinâmica gera um ciclo vicioso, no qual o governo se vê obrigado a pagar juros mais altos, elevando o custo da dívida pública e dificultando ainda mais o controle do déficit fiscal.
Ainda assim, investir em títulos públicos atrelados à inflação com essas taxas parece uma boa opção para os investidores. Ao simular o desempenho de uma taxa de IPCA+ 6,5% a.a. nos últimos cinco anos, o retorno obtido foi superior às referências, CDI e Ibovespa. Evidentemente, a máxima “rentabilidade passada não é garantia de rentabilidade futura” permanece. No entanto, uma taxa de 6,5% carrega uma boa margem de segurança em relação ao CDI e até mesmo ao investimento em ações, sendo superior à meta de retorno de longo prazo em nossas projeções de aposentadoria para os clientes da Múltiplos.
Com essas taxas, continuamos a visualizar oportunidades nos títulos do Tesouro IPCA+, especialmente para quem considera segurá-los até o vencimento e está preparado para a marcação a mercado, em caso de volatilidade de preços no curto prazo, em um cenário de piora fiscal ou elevação dos juros.