Os preços dos ativos nos mercados internacionais transmitem uma falsa sensação de tranquilidade. É preciso atenção: A inflação americana continua resistente, o debate sobre a autonomia do Federal Reserve saiu dos bastidores e virou pauta pública, e a política fiscal dos EUA se expande sem contrapartida.
Ao mesmo tempo, o pacote mercantilista de tarifas e restrições à imigração encarece cadeias produtivas, reduz eficiência e sustenta uma base de preços mais altos. Podemos estar em um cenário onde a distância entre o que os preços dos ativos embutem e o que os fundamentos transmitem ficou grande demais.
Interferência no FED e o efeito sobre a economia americana
O Fed, banco central americano, iniciou o corte de juros em setembro. Tecnicamente, há argumentos para isso. O problema é outro: a autonomia do banco central está em debate, com interferência política do presidente Donald Trump no centro da conversa.
A confiança do Fed foi construída com décadas de decisões duras — inclusive em momentos como os anos 70, quando a pressão política pedia uma coisa e a autoridade monetária fez outra, justamente para domar a inflação dos Estados Unidos. Essa reputação de independência estabilizou expectativas por muito tempo. Agora, ela parece sob ameaça.
Para o investidor, que utiliza as decisões de juros dos Estados Unidos como parâmetro para suas decisões, não basta perguntar se o corte foi “técnico” ou não. A simples existência de uma tentativa de interferência já complica o cenário, porque mina a previsibilidade das próximas decisões.
Dito isso, vale separar os três caminhos possíveis deste ciclo:
- Corte saudável. A inflação dos Estados Unidos mostra convergência consistente e o mercado de trabalho acomoda. O alívio de juros melhora as condições financeiras sem abalar expectativas, e os preços de ativos reagem de forma positiva.
- Corte por piora econômica. A atividade enfraquece antes de a inflação dos Estados Unidos estar, de fato, controlada. O Fed corta para amortecer a desaceleração, mas a incerteza aumenta, os prêmios de risco sobem e as ações caem.
- Corte politizado. O corte ocorre sob pressão do Executivo. Mesmo que haja argumentos técnicos, a leitura é de ingerência. A confiança na instituição diminui, as expectativas ficam mais voláteis e o investidor passa a duvidar da trajetória futura de inflação e juros dos Estados Unidos. Nesse caso, o impacto sobre as ações americanas também parece negativo.

Hoje, os preços das ações americanas parecem refletir a visão dos benefícios do corte de juros (Cenário 1) e a subestimar o cust de um ciclo percebido como politizado (Cenário 2) ou motivado por uma economia mais fraca (Cenário 3).
Em resumo, acreditamos que os preços dos ativos americanos, que se mantém na máxima histórica vide, Figura 2, refletem um otimismo exagerado enquanto existem vários riscos relevantes no radar.

O dólar em queda estrutural ou passageira?
O dólar enfraqueceu contra várias moedas em 2025. Antes de analisar o cenário que tem levado a esse resultado, vale o disclaimer: devemos evitar transformar a discussão cambial em exercício de adivinhação. A exposição dolarizada deve existir como política de portfólio, preservando poder de compra e reduzindo a necessidade de timing perfeito.

Então, quais fatores explicam essa queda? Destacamos 3:
- Choque mercantilista: as tarifas de Trump e a restrição a migração do governo Trump aumentam a incerteza com a economia americana e pode reduzir a atratividade para o capital estrangeiro; Efeito marginal: Dólar fraco;
- Cíclico (desaceleração americana): geração líquida de emprego fraca, consumo menos vigoroso, empresas mais seletivas nos seus investimento e queda na taxa de juros; Efeito marginal: Dólar fraco;
- Estrutural: Aqui temos efeitos divergentes, no micro, a revolução na IA pode trazer maior produtividade e crescimento econômico no médio e longo prazo. O que é positivo para bolsa e dólar. Já o aumento da dívida americana puxado pela indisciplina fiscal, pode aumentar os riscos para o câmbio. Nesse caso, o fator estrutural é incerto;
Ou seja, no curto prazo, a queda do dólar é justificada por fatores econômicos, não se trata apenas de especulação.

Voltamos agora nossa análise para a pergunta inicial, trata-se de uma queda estrutural ou passageira?
O dólar estruturalmente em queda em relação a outras moedas implicaria em uma redução expressiva do seu papel como moeda de reserva global. Já apontamos em panorama anteriores que a falta de substituto adequado para esse papel é o maior fator que protege o dólar. Nem o Yuan chinês nem o Euro possuem as características necessárias para suplantar o dólar.
Também é válido destacar que a narrativa do enfraquecimento do dólar e da perda do seu status como reserva é antiga, reunimos algumas matérias desde a década de 70. Até agora, o dólar se manteve hegemônico.

No nosso entendimento, é provável que o dólar continue perdendo seu papel de forma gradual, como aliás, já vem acontecendo desde 2001, onde o dólar ocupava um pico entre a composição de reservas internacionais.

Em resumo, a queda do dólar não é à toa, existem motivos válidos para isso. Não devemos interpretar o momento atual como uma oportunidade de compra clara. A resposta para a pergunta: “Devo comprar ou não?” Deve vir da alocação estratégica de cada investidor, ou seja, qual o percentual de longo prazo em ativos dolarizados que foi definido para a sua carteira? Siga-o.
A ameaça na Europa: risco real de expansão da guerra pela Rússia
Os receios aumentam. A Rússia intensificou ações híbridas — violações aéreas, ataques cibernéticos e sondagens navais — para testar o tempo de resposta e a coesão da OTAN. Ainda não se trata de uma invasão convencional, mas a frequência maior dessas provocações eleva o risco de erro de cálculo.
O objetivo russo parece ser medir se a reação a um incidente na Polônia teria o mesmo peso que a de países menores e mais expostos, como Estônia e Lituânia. Se a resposta for assimétrica, a credibilidade do Artigo 5º, que obriga todos os membros da aliança a reagir em caso de ataque, perde força. Isso deixaria a Rússia mais confortável para ampliar suas provocações.
Esse cenário adiciona riscos relevantes ao futuro europeu: maior pressão fiscal com o aumento dos gastos em defesa e a possibilidade concreta de expansão da guerra para o leste do continente. O reflexo direto para os mercados é mais volatilidade no câmbio e nos ativos de renda variável da região.
Brasil: MP 1.303 e o risco de aumento do IR sobre investimentos
A Medida Provisória 1.303, em discussão no Congresso, redefine a tributação de aplicações financeiras a partir de 2026. A proposta unifica as alíquotas em 17,5% e elimina a tabela regressiva da renda fixa, que premiava o investidor de longo prazo com menor imposto.
Na prática, LCI e LCA deixam de ser totalmente isentas em novas emissões e passam a ter tributação de 7,5%. Fundos incentivados de infraestrutura seguem preservados, mas os demais fundos entram no novo padrão de 17,5%. O único ponto positivo é a possibilidade de compensar perdas entre diferentes aplicações, o que facilita a gestão tributária da carteira.
Se aprovado, o texto simplifica a regra, mas aumenta a carga para boa parte dos investidores. É um ajuste que muda o cálculo de retorno líquido e reforça a necessidade de revisitar do planejamento tributário, especialmente para os resgates de investimentos.
Brasil: O Banco Central manteve a Selic e preservou a régua técnica
Os efeitos da Selic em 15% já são visíveis. O PIB registrou a primeira revisão negativa desde 2022, encerrando a dúvida sobre a eficácia do aperto. O crédito está mais caro, o consumo de bens duráveis perdeu força e os serviços começam a mostrar desaceleração. É desconfortável no curto prazo, mas é o caminho necessário para trazer a inflação de volta à meta.
Vale destacar também o paralelo institucional. No Brasil, a indicação de Gabriel Galípolo para a diretoria do Banco Central gerou receio de interferência política nas decisões da instituição. Na prática, não foi o que ocorreu. O BC tem mantido uma postura técnica, até mais dura do que alguns economistas considerariam ideal, e em linha com a missão de preservar a convergência inflacionária, mesmo contra a vontade do governo, que preferiria cortes mais rápidos. O contraste é que, enquanto por aqui a independência foi preservada, nos Estados Unidos a credibilidade do FED passou a ser questionada, algo impensável há poucos anos para uma instituição vista como referência global de autonomia.
A deflação registrada em agosto ajudou a aliviar a pressão inflacionária e reforçou a percepção de que o aperto monetário está surtindo efeito. Em paralelo, o movimento do banco central americano em direção a cortes de juros cria um ambiente externo menos hostil, o que facilita o trabalho do BC brasileiro e abre espaço para uma redução gradual dos juros por aqui. O recado, no entanto, segue o mesmo: a queda só será sustentável se vier acompanhada de previsibilidade fiscal e disciplina no combate à inflação.
O que fazer na carteira?
Seguimos com a alocação concentrada em títulos atrelados ao IPCA, que continuam oferecendo taxas atrativas e funcionam como proteção em um país que convive com riscos inflacionários constantes e ainda não estabilizou esse indicador. Em paralelo, mantemos uma posição relevante em títulos pós-fixados, aproveitando o nível elevado da Selic. Continuaremos acompanhando a evolução dessa variável nos próximos meses, mas, por ora, a alocação permanece a mesma.
Na parcela offshore, mantemos nossa posição inalterada. Diante de sinais ainda incertos, seguimos com a alocação estratégica, pensada no longo prazo, em ativos americanos/dolarizados, ajustada ao perfil de cada investidor. Essa postura evita a necessidade de movimentos oportunistas e garante disciplina na proteção do portfólio.
Para saber mais sobre nossas estratégias de investimento e tirar suas dúvidas, entre em contato conosco.